RESUMO DO LIVRO : A CRIANÇA E O NÚMERO – CONSTANCE KAMII
INTRODUÇÃO
As
pesquisas de Piaget alteraram significativamente a prática de boa parte
dos professores das séries iniciais, entretanto, uma compreensão
equivocada desse teórico levou a um grande número de aplicações práticas
inadequadas. Em seu livro - A criança e o número: Implicações Educacionais da Teoria de Piaget para a Atuação Junto a Escolares de 4 a 6 anos –
Constance Kamii propõe-se a responder dúvidas referentes à aplicação da
pesquisa e da teoria de Piaget no ensino do número. Quatro tópicos
organizam o enfoque proposto pela autora: “1) A natureza do número. 2)
Objetivos para ‘ensinar’ número. 3) Princípios de ensino. 4) Situações
escolares que o professor pode usar para ‘ensinar’ número.” (p.8)
Numa
breve revisão sobre a prova da conservação, a autora esclarece que as
crianças de quatro anos tendem a acreditar que uma determinada
quantidade de objetos se altera em função da disposição destes numa
superfície. Por exemplo, se uma professora coloca oito pedaços de isopor
enfileirados e entrega outros oito pedaços para a criança enfileirar, a
tendência é que a criança os disponha de forma mais espaçada e que, por
causa desse espaçamento, acredite ter enfileirado mais pedaços de
isopor que a professora. Isso significa que a criança ainda não conserva
quantidades, entretanto, não significa que a professora deve
“ensiná-la” a conservar fazendo, por exemplo, a correspondência um a um.
1) A NATUREZA DO NÚMERO
Para
Piaget, os conhecimentos diferenciam-se, considerando suas fontes
básicas e o modo de estruturação, em três tipos: conhecimento físico,
lógico-matemático e social (convencional). O conhecimento físico e o
social são parcialmente externos ao indivíduo enquanto que a fonte do
conhecimento lógico-matemático é interna.
O
conhecimento físico é o conhecimento dos objetos da realidade externa:
são as propriedades físicas que podem ser conhecidas pela observação.
Entretanto, a relação entre as propriedades físicas de dois objetos é
construída a partir do conhecimento lógico-matemático. É também o
pensamento lógico-matemático que atua quando analisamos numericamente os
objetos, estabelecendo relações de igual, diferente, mais etc. Assim “
número é uma relação criada mentalmente por cada indivíduo.” (p.15)
Segundo
Piaget, existem dois tipos de abstração: a empírica (ou simples) que
consiste em focalizar uma certa propriedade do objeto e ignorar as
outras; e a abstração reflexiva que envolve a construção de relações
entre os objetos. Por não ter existência na realidade externa, a
abstração reflexiva é uma construção realizada pela mente. A abstração
reflexiva é usada para construir o conceito de número. Entretanto, esses
dois tipos de abstração são interdependentes: “a criança não poderia
construir a relação ‘diferente’ se não pudesse observar propriedades de
diferença entre os objetos” (p.17), por outro lado, para perceber que um
certo peixe é vermelho(abstração empírica), ela necessita possuir um
esquema classificatório para distinguir o vermelho de todas as outras
cores.
Assim,
número é, de acordo com Piaget, “uma síntese de dois tipos de relações
que a criança elabora entre os objetos (por abstração reflexiva). Uma é a
ordem e a outro é a inclusão hierárquica.” (p.19) A ordem é importante
para assegurar que não deixamos nenhum objeto sem contar, ou que não
contamos um mesmo objeto duas vezes. A inclusão hierárquica diz respeito
à capacidade de compreender que um está contido em dois, dois está
contido em três, e assim sucessivamente.
Se
perguntarmos, por exemplo, a uma criança de quatro anos se existem mais
animais ou vacas no mundo. Elas terão dificuldades em responder porque o
seu pensamento ainda não é flexível o suficiente para ser reversível. A
reversibilidade diz respeito à habilidade de realizar mentalmente
operações opostas. No exemplo acima, a criança não consegue cortar o
todo ‘animais’ em partes e as reunir mentalmente.
Assim
sendo, a teoria de Piaget contradiz o pressuposto comum de que os
conceitos numéricos podem ser ensinados pela transmissão social. As
palavras um, dois, três... São exemplos de conhecimento social, contudo,
os conceitos numéricos não são adquiridos através da linguagem. Por
outro lado, número também não é alguma coisa conhecida inatamente, por
intuição. Assim, a estrutura lógico-matemática do número é construída
através da criação e coordenação de relações e não pode ser ensinada
diretamente porque a criança tem que construí-la por si mesma.
2) OBJETIVOS PARA “ENSINAR” NÚMERO
Para
que se possa extrair implicações pedagógicas dos temas tratados no 1º
capítulo é preciso compreender o contexto global da obra de Piaget.
Sendo o conceito de número uma construção interna de relações, é preciso
estimular, nas crianças, a autonomia para estabelecer entre os objetos,
fatos e situações todos os tipos possíveis de relação.
Aliás,
para Piaget, o desenvolvimento da autonomia deve estar no centro de
qualquer proposta educativa. Autonomia é o ato de ser governado por si
próprio, o oposto de heteronomia que significa ser governado por outra
pessoa. É muito importante destacar que a autonomia é indissociavelmente
social, moral e intelectual.
Assim,
o conceito de número não pode ser “ensinado” às crianças pela via da
apresentação e repetição desse conceito pelo professor. É preciso que as
crianças construam estruturas mentais para abarcar esse conceito e a
melhor forma de fazer isso é estimulando-as a colocar todas as coisas em
todos os tipos de relações.
3) PRINCÍPIOS DE ENSINO
a) A criação de todos os tipos de relações.
O
educador deve encorajar a criança a estar alerta e colocar todos os
tipos de objetos, eventos e ações em todas as espécies de relações
possíveis.
b) A quantificação de objetos.
I. O
educador deve encorajar as crianças a pensarem sobre número e
quantidades de objetos em situações que sejam significativas para elas,
ou seja, as crianças devem pensar sobre quantidade sempre que sentirem
necessidade e interesse.
II. O
educador deve encorajar a criança a quantificar objetos logicamente e a
comparar conjuntos (em vez de encorajá-las a contar). O educador pode,
por exemplo, pedir a uma criança que apanhe guardanapos ou copos
suficientes para todas as crianças de uma mesa, em vez de dizer-lhe para
apanhar uma quantidade definida de objetos.
III. O
educador deve encorajar a criança a fazer conjuntos com objetos móveis.
Folhas de exercícios com desenhos não são apropriadas para ensinar o
número elementar, pois pode conduzir à resposta certa pela maneira
errada. O ideal é que a criança trabalhe com objetos móveis.
c) Interação social com os colegas e os professores.
I. O
educador deve encorajar a criança a trocar ideias com seus colegas.
Através da troca de ideias e do questionamento entre colegas, as
crianças podem chegar à resposta certa sem a correção feita pelo
professor.
II. O
educador deve imaginar como é que a criança está pensando e intervir de
acordo com o que parece estar sucedendo em sua cabeça. Mais do que
corrigir a resposta dada pela criança, o professor deve tentar
reconstituir o seu raciocínio para entender a base do “erro”. Por
exemplo, se uma criança está distribuindo xícaras e falta uma, pode ser
que ela tenha esquecido de contar a si própria. Nesse caso, o professor
pode perguntar casualmente: “você contou a si mesmo?”
4) SITUAÇÕES ESCOLARES QUE O PROFESSOR PODE USAR PARA “ENSINAR” NÚMERO
A autora apresenta, neste capítulo, exemplos de atividades que focalizam a quantificação.
a) VIDA DIÁRIA
Durante a sua rotina cotidiana, a professora pode transferir algumas responsabilidades para as crianças, por exemplo:
I. A distribuição de materiais
Pedir às crianças que tragam o número suficiente de xícaras para todos à mesa.
II. A divisão de objetos
Na
hora do lanche, a professora pode dar uma certa quantidade de
bolachinhas a uma criança e pedir que ela as distribua entre os colegas,
encorajando o grupo a trocar ideias sobre a execução da tarefa.
III. A coleta de coisas
A
coleta de bilhetes de permissão assinados pelos pais é uma oportunidade
natural de ensinar a composição aditiva do número. A professora poderá
propor as seguintes questões: “quantas crianças trouxeram seus bilhetes
hoje?” “quantas trouxeram ontem?” etc.
IV. Manutenção de quadros de registros
A professora pode providenciar um quadro para registrar o número de alunos presentes e ausentes.
V. Arrumação da sala
A professora pode sugerir que cada criança guarde 3 coisas, se houver um momento para limpeza e arrumação da sala.
VI. Votação
Essa
prática é importante para ensinar a comparação de quantidades, além de
favorecer a autonomia, uma vez que atribui poder de decisão às próprias
crianças.
b) JOGOS EM GRUPO
I. Jogos com alvos
Bolinhas de gude e boliche são bons para a contagem de objetos e a comparação de quantidades.
II. Jogos de esconder
O
jogo de esconder laranjas é excelente para trabalhar a divisão de
conjunto, adição e subtração. Funciona da seguinte forma: A professora
esconde cinco laranjas em lugares diferentes e as crianças vão
procurá-las. Durante a brincadeira, quando as crianças já tiverem
encontrado algumas laranjas, a professora pode perguntar quantas ainda
faltam para serem encontradas.
III. Corridas e brincadeiras de pegar
A
dança das cadeiras é uma excelente oportunidade para as crianças
compararem quantidade. A preparação do jogo é a parte mais importante. A
professora deve deixar que as próprias crianças arrumem as cadeiras e
decidam como querem jogar – com o mesmo número de cadeiras e de
crianças, ou com uma cadeira a menos.
IV. Jogo de adivinhação
Uma
criança pega uma carta (entre 10 cartas numeradas) e as outras tentam
adivinhar qual foi o número retirado. A criança que tem a carta nas mãos
responde a cada tentativa dizendo: “não, é mais” “não, é menos” “sim”.
V. Jogos de tabuleiros
Uma
série de jogos de tabuleiros, daqueles em que se joga um dado e se
avança o número de casas sorteados, como o “Lero-Lero! Cereja – 0” pode
ser utilizado para construir o conceito de número.
VI. Jogos de Baralho
Jogos de baralho como “Memória” “Batalha” e “Cincos” são excelentes para o desenvolvimento do pensamento lógico e numérico.
APÊNDICE
A autonomia como finalidade da Educação: implicações da Teoria de Piaget.
Neste apêndice, a autora faz uma revisão do livro: O julgamento Moral da Criança de
Piaget, publicado em 1932. Começa estabelecendo a diferença entre
autonomia que significa ser governado por si mesmo e heteronomia que é
ser governado por outra pessoa. Cita um exemplo extremo da moralidade da
autonomia: Elliott Richardson, personagem de Watergate, que foi a única
pessoa do gabinete do Presidente Nixon que se recusou a mentir, a
pedido do seu superior, pedindo demissão.
A AUTONOMIA MORAL
Todos
os seres humanos nascem heterônimos e vão se tornando,
progressivamente, mais autônomos. Entretanto, boa parte das pessoas não
desenvolve a autonomia de forma ideal. A questão é que grande parte dos
adultos reforçam a heteronomia natural das crianças através de
recompensas e castigos, quando deveriam estimular o desenvolvimento da
autonomia trocando pontos de vistas com os pequenos.
Segundo Kamii, a punição acarreta três tipos de consequências:
1) Cálculo de riscos → a
criança repetirá o mesmo ato que ocasionou a punição, só que dessa vez
tomará cuidado para não ser descoberta. Ou pode decidir que, mesmo sendo
descoberta, o prazer de cometer o ato infracionário compensa a punição.
2) Conformidade cega → as crianças decidem que é melhor obedecer os adultos sempre para garantir a sua segurança e respeitabilidade.
3) Revolta → Algumas
crianças, que antes se comportavam bem, decidem parar de obedecer e
começar a viver por si próprias. Contudo, existe uma grande diferença
entre autonomia e revolta. O não-conformismo ou a revolta não tornam,
necessariamente, a pessoa mais autônoma.
As recompensas também reforçam a heteronomia.
Para
que as crianças desenvolvam a autonomia moral, os adultos devem
incentivá-las a construir por si próprias, os seus valores morais.
Entretanto, é preciso ser realista, não há como evitar totalmente as
punições. É possível, porém trocar as punições pelo que Piaget chamou de
sanções por reciprocidade.
As
sanções por reciprocidade são aquelas que estão diretamente
relacionadas com o ato infracional. Kamii aborda quatro exemplos de
sanção por reciprocidade:
1) Exclusão temporária ou permanente do grupo. → Quando
uma criança perturba a leitura de uma história, por exemplo, a
professora pode dizer. – “Você pode ficar aqui sem nos aborrecer, ou
terei que lhe pedir que vá para o canto dos livros ler sozinha.”
2) Apelar para a consequência direta e material do ato. → A criança que conta uma mentira pode ser confrontada com o fato de que as pessoas podem não acreditar mais nelas.
3) Privar a criança de uma coisa que ela usou mal. → A criança que usa mal um brinquedo pode ser impedida de usá-lo até que aprenda a utilizá-lo corretamente.
4) Reparação → A criança que estraga um trabalho de um colega pode ser convidada a ajudar a consertá-lo.
Contudo,
para que essas sanções por reciprocidade não se transformem em punição,
é preciso que haja uma relação de afeto e respeito mútuo entre a
criança e o adulto.
Para
finalizar, a autora destaca que os valores morais não são
internalizados ou absorvidos de fora para dentro, mas construídos
interiormente, através da interação da criança com o meio.
A AUTONOMIA INTELECTUAL
Uma
pessoa intelectualmente autônoma necessita estar realmente convencida
do seu erro para aceitar a correção de outras pessoas, enquanto as
heterônomas acreditam em tudo o que lhe dizem, sem questionar.
A
criança não adquire conhecimentos internalizando-os diretamente do seu
meio ambiente. Em vez disso, as crianças constroem o conhecimento
criando e coordenando relações entre objetos, fatos, etc.
Se
o professor simplesmente marca como erro uma resposta do tipo “4 + 2 =
5”, sem tentar reconstituir o raciocínio da criança e convencê-la do seu
erro, a tendência é que essa criança acredite que a verdade advém
somente da cabeça do professor.
“Quando
uma criança diz que 4 + 2 = 5, a melhor forma de reagir, ao invés de
corrigi-la é perguntar-lhe – ‘Como foi que você conseguiu 5?’ As
crianças corrigem-se frequentemente de modo autônomo, à medida em que
tentam explicar seu raciocínio a uma outra pessoa. Pois a criança que
tenta explicar seu raciocínio tem que descentrar para apresentar a seu
interlocutor um argumento que tenha sentido. Assim, ao tentar coordenar
seu ponto de vista com o do outro, frequentemente ela se dá conta do seu
próprio erro.” (p.115)
Assim,
ao transferir o foco do pensamento pedagógico daquilo que os
professores ensinam para como as crianças aprendem, Piaget sugere uma
revolução Copernicana na educação. Assim, os docentes precisam rever os
seus objetivos colocando a construção da autonomia como finalidade maior
da educação.
ETAPA 4
Resenha do Livro “A Criança e o Número”
Nesta obra Kamii faz uma justificativa de sua teoria na construção do número e sua contagem, baseados em diversos experimentos realizados em diferentes faixas etárias seguindo o resultado das pesquisas de Jean Piaget. A autora defende que diferentemente do que algumas interpretações indicam desenvolver e exercitar os aspectos lógicos do número com atividades pré-numéricas (seriação, classificação e correspondência termo a termo) é uma aplicação equivocada da pesquisa de Piaget, pois ele tinha preocupações na área epistemológica e não na didática.
Kamii cita que quando o professor ouve falar na não conservação dos números, refletem no significado da aprendizagem do mesmo. Aplicando a teoria de Piaget, o professor pode utilizá-la discutindo sobre quatro aspectos: a natureza do número; objetivos para o ensino do número; princípios de ensino; situações problemas que o educador pode usar para a aprendizagem do número.
A autora mostra também o quanto se faz importante a aplicação de jogos no auxilio à aprendizagem e fixação de conceitos,explica que o meio ambiente indiretamente oferece uma melhor facilidade no desenvolvimento do raciocínio
lógico matemático. “As crianças de culturas industrializadas desenvolvem-se mais rapidamente do que as que tem culturas menos industrializadas, aquelas que possuem um nível socioeconômico médio alto se desenvolvem melhor do que as de médio baixo, e as que vivem na zona urbana se desenvolvem mais rápido do que as que vivem na zona rural”. Kamii elaborou também, seis princípios de ensino sob três títulos:
1. Criação de todos os tipos de relações
Encorajar a criança a estar alerta e colocar todos os tipos de objetos, eventos e ações em todas as espécies de relações.
2. A quantificação dos objetos
a. Encorajar as crianças a pensarem sobre numero e quantidades de objetos quando estes seriam significativos para elas.
b. Encorajar a criança a quantificar objetos logicamente e a comparar conjuntos (em vez de encorajá-las a contar).
c. Encorajar a criança a fazer conjunto com objetos móveis.
3. Interação social com os colegas e os professores.
a. Encorajar a criança a trocar ideias com seus colegas.
b. Imaginar como é que a criança está pensando, e intervir de acordo com aquilo que pareça estar sucedendo em sua cabeça.
ATPS FUNDAMENTO E METODOLOGIA DE MATEMÁTICA
Cristiane Nogueira Rios RA 175835 6MA
Daniele Cristiane S. Melo RA 176322 6MA
Elisabete Augusto da Silva RA 189950 5MA
Ester Portela RA 136683 6MA
Suely Taira Zuim RA 180361 5MA
Professor (a) Orientador (a): Maria da Penha Tessari